O frio intenso que
chegou ao sul do país mudou a rotina de muitos moradores de rua. Em Bagé, na Região
da Campanha, a mínima registrada hoje foi de 2ºC, mas com sensação
térmica de 1ºC, de acordo com o noticiário local. Entre oito a dez pessoas em
situação de rua passaram a noite em um abrigo montado no ginásio
Presidente Médici (Militão).
Porém,
quem circula pelas ruas de Bagé-RS nota a presença de prédios e casarões com
arquitetura histórica, alguns construídos no século XIX e tombados pelo
patrimônio histórico, e em meio a tudo isso, com várias tribos urbanas existentes
em nossa cidade, encontramos a figura emblemática de FALCÃO. Um morador de rua
que fez da calçada próximo ao Mercado Nacional, na Tupi Silveira, sua
residência há 13 anos. Falcão é uma das personalidades de rua mais conhecidas
de Bagé.
Na
segunda-feira que passou, numa tarde com o tempo emburrado, conversei com Falcão,
o qual contou que desde os 15 anos mora na rua. "Sempre fui um andarilho,
eu juntava latinha em Porto Alegre, quando fui atropelado, e após o acidente
fiquei com problemas nos dois joelhos, sem conseguir trabalhar", lembrou
com lagrimas no olhar, em determinado momento encenou o acontecido, como ficou
esperando até o comparecimento de uma viatura da Brigada Militar que o socorreu.
Ao ser indagado porque não foi procurar abrigo no ginásio Militão em Bagé na última semana, quando a temperatura média chegou abaixo de zero, Falcão, em tom sério, disse que na barraca, ele e a sua companheira, a cadela Brigite, não sentem frio. "Eu tenho oito cobertores e bastantes roupas porque ganho só coisa boa, e tem outra coisa, aqui eu tenho tudo. Sair daqui e deixar a minha cachorrinha, nem pensar. Se eu vou para o ginásio, no outro dia, eu chego e levaram tudo que é meu, por isso não vou para um lugar que posso estar tirando a vaga de outra pessoa que esteja precisando mais do que eu", esclareceu Falcão.
Sua companheira Brigite tentava chamar a atenção todo o tempo, a relação dos dois parece ser muito especial. Percebe-se isso no olhar. O andarilho cuida dela como um ente querido. Contou que antes dela, por mais ou menos 13 anos, a cachorra Sofia foi sua fiel escudeira. E com o exício de Sofia e o sofrimento que causou sua perda, um amigo resolveu presenteá-lo com uma filhotinha, Brigite uma mestiça com Pit Bull, muito carinhosa e prestativa.
Falcão fez um café para ele,
convidou-me para sentar e dialogamos sobre seus dias de andarilho e morador de
rua, disse que nunca precisou ir a um médico e que quando criança teve caxumba
e sapinho, sua mãe curou com uma receita caseira passada por gerações de sua
família. Contou que recebeu a alcunha “Falcão” de um amigo, tal de “Capitão
Satanás”, que de Satanás não tinha nada, pois era um homem inteligente e
acolhedor que ajudou e orientou Falcão.
Indagado se precisava de algo falou que as pessoas estão sempre ajudando ele, motivo pelo qual quer agradecer a todos por esses anos, mas que precisava de um radio a pilha e uma roupa para a Brigite, tamanho GG, no momento.
Ao término de nossa
conversa me mostrou fotos antigas, textos e algumas cartas que escreveu para um
jornal local, nesse momento li um de seus inúmeros textos, com uma escrita
firme e uma caligráfica de causar inveja, um escrito para uma boa reflexão.
Despedimo-nos com sorrisos e um belo aperto de mão.
Jornalista Tibico da Campanha.